sábado, 13 de novembro de 2010

A Rifa do Timão, rumo a 2014

Está na hora de a nação corintiana mostrar o seu valor na construção do Itaquerão, o estádio que vai sediar a abertura da Copa de 2014. E, para isso, basta uma dose de ousadia e empreendedorismo da diretoria do time. Por que não empreender uma campanha gigante de arrecadação de recursos junto aos 25 milhões de torcedores do segundo time mais popular do País? E, melhor, isso pode ser feito de uma maneira que os torcedores contribuintes também participem da festa, com chances de faturar. Vamos à proposta da RIFA DO TIMÃO, RUMO A 2014..

A idéia é aproveitar a paixão que a fiel torcida comprova todos os dias ao clube. O Corinthians venderia uma rifa de preço popular, de R$ 10 a no máximo R$ 20. Cada bilhete dá direito a participar de um sorteio mensal, transmitido em rede nacional de televisão, de um carro (ou mais) e cinco (ou mais) aparelhos de TV LED. Cada bilhete dá direito a um número para participar do sorteio. Portanto, quem comprar mais de um, concorre com mais números, com mais chances de ganhar. Este modelo permite que mesmo o torcedor mais pobre possa concorrer, comprando um único bilhete. E permite aos mais abonados que comprem mais bilhetes, concorrendo com mais chances e contribuindo muito mais para o estádio.

Uma campanha poderia ser feita entre os corintianos ricos e famosos, como empresários, artistas etc. Eles comprariam um número muito maior de bilhetes, por exemplo, 100, 500 ou mil, e se comprometeriam a devolver o prêmio para ser RESSORTEADO no caso de serem premiados. Tudo em nome de dar popularidade à rifa e atrair a massa.

E quem forneceria os carros e aparelhos de TV? Fácil. Qualquer grande montadora de automóveis e qualquer grande fabricante de TVs adoraria participar da campanha como patrocinador, pois teria seu nome citado na campanha publicitária e nos sorteios. Da mesma forma, as redes de TV se estapeariam pelo direito de transmitir o sorteio.

Seria um jogo de ganha-ganha. O Corinthians arrecadaria dinheiro para construir o estádio SEM MENDIGAR DINHEIRO PÚBLICO, os patrocinadores teriam máxima exposição e os TORCEDORES concorreriam aos prêmios e ainda teriam a satisfação de ajudar o time do coração a ter um grande estádio para a Copa. Para brindar tudo isso, cada comprador de bilhete ganharia um DIPLOMA de torcedor contribuinte, autografado pelo RONALDO, para ser dependurado com orgulho em sua casa e mostrar para filhos e netos na posteridade.

Se a RIFA vender 20 milhões de bilhetes, arrecadará R$ 200 milhões no caso de cada um custar R$ 100. O montante subiria a R$ 400 milhões caso o preço seja de R$ 20, valor acessível a qualquer torcedor.

Se uma iniciativa similar for levada em frente, o Corinthians não apenas ganhará um estádio, como estará dando um exemplo ao Brasil: mostrará que é possível atingir grandes objetivos, gerando riqueza e viabilizando investimentos, sem depender do dinheiro público, que poderia ser aplicado na resolução dos ainda imensos problemas sociais e de infraestrutura do País, que acometem tanto corintianos quando os torcedores dos demais clubes.

Na Folha deste sábado, 13/11/10, José Geraldo Couto propõe uma “vaquinha da Fiel” e lembra que iniciativa semelhante foi empreendida pelo Vasco 90 anos atrás para construir o São Januário, então o maior estádio do Brasil. A proposta da RIFA pega carona na de Couto e apenas acrescenta os sorteios, incluindo os bravos torcedores na festa. Se os vascaínos de ontem puderam, por que os corintianos de hoje não podem?

Que tal, FIEL?

domingo, 7 de março de 2010

O inimigo das cotas ataca

O senador Demóstenes Torres (DEM) defende a velha tese de que no Brasil nao tem racismo. Tem sim, e do pior tipo, do camuflado. Qualquer negro, nordestino ou índio já viveu uma ou várias situações de discriminação. Os judeus também, mas, por serem geralmente ricos ou classe média, nao sentem o preconceito no nível econômico - onde ele é mais cruel e geralmente invisível, aparecendo apenas nos indicadores. Ao contrário do que diz o senador, os indicadores comprovam: há pobres brancos e negros, mas os negros sao bem mais pobres. Há ricos brancos e negros, mas os brancos sao infinitamente mais ricos. É difícil encontrar um branco pobre que venha de uma familia onde todos sao muito pobres. Sempre tem um arrimo. Entre os negros, isto é muito comum. Um negro pobre muitas vezes nao tem sequer um unico parente remediado a quem recorrer. Nao dá para comparar. E esta idéia de que as cotas vao transformar o Brasil em um país racista, opondo brancos a negros, é piada. As cotas estao aí e nada disso ocorreu. Mas o contrário é verdade. O Brasil nunca teve cotas antes, e a discriminação e o preconceito sempre existiram.

Uma comparação do Brasil com os EUA (onde existe cota há muito tempo...) é vergonhosa para nós. Lá, os negros sao apenas 10% (incluidos os mestiços como Obama) da população, e no entanto, mesmo sofrendo preconceitos, já elegeram um presidente. Há negros no Congresso, nos governos e nas diretorias das grandes empresas. No Brasil, onde negros e mulatos sao quase 50%, só recentemente um deles chegou ao STF... No entanto, enquanto nos EUA o racismo é admitido e enfrentado, no Brasil é proibido sequer falar nele. O que existe no Brasil não é a ditadura do politicamente correto, senador, e sim a patrulha da falsa democracia racial.

Ia esquecendo, ditadura do politicamente correto existe, sim, nos EUA. Lá, em qualquer filme, sempre tem que ter um personagem negro, e em posição de destaque. Aqui, só recentemente os negros na Globo deixaram de fazer apenas papel de empregada doméstica e ajudante. Aqui, já tivemos os casos das "paquitas", onde só podia entrar loira. Nos EUA, este tipo de coisa horrenda nunca poderia existir. Lá, os negros tambem sofrem, mas lutam por cada centimetro dos seus direitos, sem se deixar levar pelo argumento de "democracia racial". Aqui, os negros, antes tarde do que nunca, acordaram para nao serem enganados.

Mais uma coisa. O senador hoje acha um absurdo que os negros não celebrem a princesa Isabel. Quer dizer que, retroativamente, o senador é a favor da libertação dos escravos. Ok. Mas seria curioso se voltássemos no túnel do tempo para ver de que lado estaria o nosso ilustre representante do DEM. Ele estaria do lado dos progressistas que lutavam contra a escravidão ou estaria do lado da elite que não apenas era a favor do sistema, como tinha seus próprios escravos? Como seria? Não tem como matar essa curiosidade, pois o passado não tem volta. Mas é possível saber de que lado está hoje o senador: ele está contra um mecanismo que, mesmo tendo seus defeitos, tem o mérito de pretender dar um mínimo de direitos aos negros.

terça-feira, 7 de julho de 2009

Michael Jackson e os EUA pós-racial

Michael Jackson e os EUA pós-racial

Quis o destino que Michael Jackson, o maior astro pop da história, morresse em um período muito especial da história americana: quando a maior potência do planeta é presidida, pela primeira vez, por um negro, Barack Obama. A história uniu os dois eventos, a morte de MJ e o governo Obama, ambos símbolos da ascensão dos afro-americanos. O fenômeno político de Obama foi precedido no mundo do show-business por MJ em mais de duas décadas. Os negros já faziam sucesso na música e nos esportes nos EUA muito antes de Michael. Mas só com ele conseguiram ter um resentante no topo da cultura pop americana. Miachel não foi apenas mais um grande astro pop. Foi a maior personagem da poderosa indústria cultural americana nos anos 80 e 90.

MJ tem outro aspecto grandioso. Poucos, talvez nenhum, artista negro tenha transitado tão naturalmente entre os mundos dos brancos e negros dos EUA. Ironicamente, fez isso de forma radical, trascendendo ao bizarro, com seus tratamentos para branquear a pele e afinar os traços. De uma forma ou de outra, ninguém fez melhor a transição entre os dois grandes mundos étnicos americanos do que MJ. Suas namoradas, ou relacionamentos, seja o que for, também extrapolaram as barreiras raciais. A namorada Brooke Shields e a amiga Elizabeth Taylor, além mulher mãe dos seus filhos. Entre os amigos, McCaulley Culkin e Estiven Spielberg.

O acompanhamento em tempo real dos funerais de MJ também deixou transparecer o caráter multiracial de sua trajetória. De Roma a Berlim, de Tóquio ao Pelourinho, em Salvador, Brasil, suas últimas homenagens foram assistidas ao vivo por fãs de todas as cores, raças, religiões. A adoração a MJ foi generalizada, internacional e incondicional. Se a chegada de Obama ao poder na Casa Branca personificou o ápice da ascensão negra nos EUA, a carreira e a vida de MJ foram construtoras deste processo. Michael talvez não quisesse, mas seu sucesso espetacular foi como um endosso do potencial negro. Sua morte avivou o fenômeno em nossa mente e nos retratou a entrada nos EUA em nova era, a era pós-racial, que tem no presidente Obama mais um – e não o único – símbolo.

terça-feira, 23 de junho de 2009

O Racismo camuflado, mas cruel, no Brasil

Neste momento em que se discute se seria necessário impor cotas para modelos negras e negros nos desfiles de moda, torna-se novamente atual (embora nunca tenha deixado de ser) o debate sobre as relações raciais no Brasil. Um debate, paradoxalmente, abafado pela absurda idéia de que o racismo inexiste no País, por mais que todos os indicadores provem o contrário. A falsa idéia de democracia racial é a maior adversária da luta contra o racismo no Brasil. Infelizmente, até alguns negros se equivocam ao analisar esta questão.

No Brasil e nos EUA, mas muito mais aqui do que lá, vez por outra surge alguma liderança intelectual ou social negra a se opor a políticas afirmativas ou de compensação, como as cotas. Recentemente tivemos um caso de um líder negro no Brasil atacando o sistema de cotas raciais. Para ele, seria necessário adotar uma cota social, para os pobres em geral, mas sem especificar o benefício aos negros ou a qualquer outra minoria ou grupo.

Este é o tipo de argumento que parece correto. Mas só parece. No fundo, esta argumentação simplesmente nega a existência do racismo. Por esta visão, o que existiria é o preconceito social, a injustiça social, que penalizaria igualmente brancos e negros. Logo, não existiria racismo! Mas esta não é a realidade dos fatos. Pesquisas mostram que, quando se faz política social para os pobres em geral, os brancos pobres se beneficiam mais. È duro admitir. Mas a desigualdade não existe apenas entre ricos e pobres, mas também dentro das classes e grupos sociais.

Ricos brancos são muito mais numerosos e ricos do que ricos negros. A classe média branca é mais opulenta e numerosa do que a negra. E, por fim, os pobres brancos vivem “menos mal” do que os negros: possuem melhor escolaridade, melhor estrutura familiar (dificilmente se encontra uma família branca em que todos são pobres, mas entre negros isto é comum) e sofrem menor taxa de desemprego. Entre dois pobres desempregados com igual preparo, o branco tende a encontrar emprego mais rápido do que o negro. Por todas estas diferenças, quando se aplica uma política geral, o pobre branco se beneficia mais e primeiro, e ascende de classe social antes do negro.

Outro argumento falacioso: no Brasil seria impossível distinguir brancos e negros porque aqui seria diferente dos EUA, aqui haveria muita mistura racial. Mentira. Há muitos mestiços, mulatos, tanto aqui quanto nos EUA. Barak Obama, 50% negro e 50% branco, esta aí para provar. O ex-secretário Collin Powell era mulato, assim como o são Prince e Beyoncé, para ficar nos exemplos de famosos. A diferença é que nos EUA considera-se como negro qualquer pessoa que tenha ascendentes africanos, enquanto no Brasil as pessoas tendem a se “branquear” socialmente, escondendo a herança genética africana depois que alguma mistura racial aproxima a cor da pele mais do europeu. Mas no fundo não há diferença relevante neste ponto.

A maior diferença, isto sim, é que nos EUA existe, mais do que no Brasil, o racismo ideológico e violento, como o patrocinado pela KKK. O paradoxal, porém, é que este racismo violento insta (motiva, até) o negro americano a lutar mais vivamente por seus direitos. No Brasil, menos por culpa dos negros e mais por culpa da idéia equivocada da “democracia racial”, muitos negros se sentem envergonhados em lutar por seus direitos. Não deveriam. Os negros não devem ser oportunistas, mas também não devem perder de mente que, entre todos os povos que formaram o Brasil, foram o único que veio para cá por obrigação, e não voluntariamente. Os imigrantes brancos, ainda que pobres, chegaram aqui livres.

Outro falso argumento: pela mistura de raças, é muito difícil identificar quem é realmente negro e merece as cotas. A prática resolve esta questão. Afinal, os racistas brasileiros, ainda que camuflados, sabem muito bem diferenciar. Sabem muito bem discriminar o que é um negro na hora de negar-lhe oportunidades.

Um exemplo impagável de racismo “camuflado”, só para avivar a memória. A TV Globo produziu anos atrás uma mini-serie ambientada na Bahia, baseada em livro de Jorge Amado (Mar Morto) quase que sem atores negros. Quem conhece o litoral baiano e suas comunidades de pescadores, que inspiraram o romance do grande Jorge, sabe que a maioria esmagadora da população nesta região é formada de negros. Explicação da emissora: não haveria atores negros em número suficiente. Um argumento ridículo, como puderam na prática demonstrar os produtores do filme Cidade de Deus, que produziram um dos melhores filmes brasileiros da história utilizando predominantemente atores negros e mulatos, os quais deram um show de interpretação.

quinta-feira, 26 de março de 2009

O dom primordial

Qual será o dom primordial?
Será a beleza do corpo que nos inebria?
Ou a inteligência que nos guia?
Será a sabedoria acumulada que ilumina?
Seria o bom caráter, que nos distancia do vício?
Ou demonstrar lealdade convenceria?

Mas qual seria o dom maior?
Seria a convicção, que nos liberta da dúvida?
Ou a coragem que tudo desafia?
Seria a mansidão extrema, que da ira nos defende?
Seria a placidez, que afugenta o stress?
Seria ainda a exatidão, que do erro nos desvia?

Mas o que mais poderia ser o dom primevo?
Seria o equilíbrio, antídoto do desvario?
Não nos esqueçamos da firmeza, da justiça,
Da generosidade, do brilho da imaginação
Sem falar da responsabilidade e da gentileza
Da competência, da perspicácia e da retidão.

Mas poupemos o verbo
E também o adjetivo
Pois só um dom resta substancial
Isto nem novidade é
Há milênios se sabe, mas não custa reiterar
Pois a faina, a labuta de todo dia
Nem sempre ao homem permite
Explorar sua maior riqueza
Demonstrar sua força superior
Fazer valer seu magno poder
Então vamos ao ponto
Para tudo resumir, uma palavra bastaria
É o amor
Outro termo aqui não caberia
Sem ele, nem se feito anjos falássemos, nada valeria!

Vênus e Marte

Homens são de Marte e mulheres de Vênus?
Em termos
Mulheres, sim, são de Vênus
Buscam o prazer insondável
Seguem a trilha do desejo
Amam por amar
Querem por querer
Óbvio demais, desnecessário repetir

Mas elas também são de Marte
Guerreiras invencíveis
Batalhadores tenazes
Dão a vida pelo que é belo
Compreendem o que é sagrado
Respeitam seus instintos
Contrariam a lógica banal
E se superam na intuição

Mulheres valem um universo
Quentes como Mercúrio
Coração descomunal feito Júpiter
Esplêndidas como Saturno
Inalcançáveis como Plutão
Generosas como a Terra
Brilham como a Via-Láctea
Como cometas vêm e vão

Ao homem, resta o sonho
Pés fora do chão, cabeça na Lua
Fadado a orbitar
Forjado na caça ao mamute
Na captura do leão
Talhado para a guerra
Inclinado à aposta, exposto ao senão

O homem tem virtude démodé
É feito de barro rígido
Contundente, mas que trinca
Forte, mas destrutível

Mulheres vêm do barro mole
Flácido sim, débil jamais
Suave, mas não precário
Resiliente a toda prova
Feito para durar
Perfeito para se amoldar
Projetado para se ajustar
A mulher é a quintessência do futuro

Quando a cautela se sobressai à aventura
A pertinência vale mais do que a audácia
A cooperação suplanta o arrojo
A perspicácia se soma à intuição
O abraço se contrapõe ao murro
A ternura supera a agressão
A sutil inteligência é o nome do jogo
A mulher deixa a escuridão

O horizonte do homem se esvai
A mulher é o humano certo na hora certa
O meteoro que muda a ordem já caiu
Só o homem não viu
Se viu, não percebeu
Se percebeu, não reagiu
O homem foi e é
A mulher é e será

quarta-feira, 25 de março de 2009

A coisa mais chata do mundo

Sabe o que é mais chato do que fazer compra de mês? Possivelmente, nada. “Possivelmente” porque a concorrência é grande. Mas vamos às provas científicas, ao passo-a-passo desta torturante saga humana. Como se trata de uma atividade freqüente, não nos damos conta dela. Mas experimente analisar a ida ao supermercado em cada detalhe, separando-a em etapas. Bem, se é você quem faz as compras de mês na sua casa, talvez seja melhor não analisar, sob pena de nunca mais aceitar tal tarefa, a não ser trocando-a por todos os demais deveres domésticos, como abastecer o carro, pagar as contas, ir na reunião da escola, lavar a louça, levar o pet na tosa, etc. Ou, dependendo do seu temperamento, melhor fazê-lo. Pode servir como experiência catártica, que irá libertá-lo (a) da angústia profunda que sempre sente quando ouve sua mulher, marido, empregada ou filho (a) proferir aquela sentença enregelante: “não tem mais nada nesta casa, alguém tem de ir ao supermercado”. Enfim, de cansativo, chega o tema desta história. Então, vamos provar por “a” mais “b” porque as compras nos supermercados são a coisa mais chata do mundo.

Como já dissemos, a melhor maneira de entender porque a compra de mês supera todas as demais inúmeras chatices universais é dividi-la em fases, numerando-as, como segue:

1) Fazer a lista é muito chato. Checar a geladeira, a despensa, o armário da lavanderia... Você tem a alternativa de fazer “de cabeça”, mas correndo o risco de deixar muita coisa de fora e ter de voltar muito antes do que imaginava ao supermercado ou de ter de recorrer ao careiro mercadinho da esquina. Má idéia. Se você tem empregada fixa, pode pedir para ela fazer. Mas terá de “repassar” a lista com ela, sob pena de incorrer no risco anterior. Não tem almoço grátis!

2) Ir ao supermercado. Pegar o carro e ir ao supermercado, obviamente, é muitíssimo mais chato do que ir com a família ao cinema sábado à tarde ou pegar a estrada no feriadão. Enfim, é uma etapa chata per si. Mas adicione estresse se estiver chovendo ou, como manda a boa lei de murphy, se ocorrer de o alerta de despensa vazia soar em um sábado à tarde, horas antes de você receber os amigos! E o agravante será extra (sem qualquer trocadilho com marcas) se você escolher ir naquele hipermercado-hiper-longe-que-está-com-promoção, ou se for hora de rush, ou tudo ao mesmo tempo agora.

3) Enfim, as compras. Vocês estão me entendendo, falei compra de mês. E obviamente estou levando em conta uma família nuclear padrão brasileira, casal e dois filhos. É gasto para encher bem mais de um carrinho. Se você tem um filho só não facilita muito, mas se tem mais de dois dificulta bastante. É progressão geométrica! É chato comprar tudo, mas temos de reconhecer, os produtos in natura são um porre. Escolher as verduras, pesar as frutas e legumes... Assustar-se (protestar não adianta, seu comunista!) com o preço estratosférico das carnes... E se você tiver a infeliz idéia de levar a prole, reserve orçamento extra para os chocolates e outras delícias caras e engordantes. Se forem dois ou mais bambinos, paciência extra para as brigas e brincadeiras bestas de praxe, como ameaçar a integridade física das pessoas em geral com corridas de carrinho.

4) O caixa. Aqui é a morada da lei de murphy. Não adiante muito escolher. Se você pegar a fila menor, provavelmente descobrirá que ela tem o caixa mais lento – daí as pessoas a estarem evitando, seu idiota! E se a fila for curta e o caixa esperto, ainda assim, pela lei das probabilidades, alguma coisa dará errado. Ou justamente na sua vez acontecerá a tradicional troca de turno de caixa, ou a moça terá de repor o papel e a máquina enguiçará, ou a única pessoa à sua frente terá um problema no cartão, obrigando o caixa a chamar o fiscal, que por sua vez chamará o gerente, que por sua vez... Enfim, nunca chegará a sua vez! E também não adianta dar uma de indiferente e escolher uma fila média para ver se sua sorte melhora. Nestes casos, inevitavelmente você ficará comparando a velocidade da sua fila com a das demais e notará o óbvio: aquele sonso da fila ao lado que chegou muito depois de você já está deixando o supermercado com ar de vencedor, enquanto sua mulher está no celular perguntando como você ainda não saiu da loja. Looser!

5) Ufa, como Deus é bom! Parecia que você nunca atravessaria a fase 4, que morreria na fila. Mas a guerra está longe de terminar. Agora é levar o carrinho pesado até o carro. E não adianta se apressar, pois na esteira o carrinho fica parado. Mas como ainda não inventaram como colocar as sacolas de compras dentro do carro por telepatia, você terá de passar por mais esta. Com a diferença de que agora seu corpo já está bem cansado. E você tem apenas duas alternativas: 1) colocar com cuidado, lentamente, primeiro os produtos pesados e duros, depois os leves e frágeis, separando os de higiene e limpeza dos alimentícios – o que é um saco; ou 2) ir jogando tudo de qualquer jeito, o que é bem mais rápido (e até divertido), mas que certamente resultará em ovos quebrados, pães amassados e muita comida com gosto de detergente e água sanitária. Literalmente, é a lei de mercado, você decide!

6) Caminho de volta. Aqui uma surpresinha. Quando você veio o trânsito estava bom? Pois o tempão que você demorou lá dentro foi a conta para dar a hora do rush. E tome buzina logo que você sai do supermercado. Nem precisa dizer que a única maneira de você escapar deste congestionamento na saída é fazer o contrário e sair de casa na hora do movimento, assim quando terminar a compra estará mais calmo. De novo, livre escolha. Você escolhe como vai se ferrar, se no começo ou no final da história. Ah, ia esquecendo, se você quis aproveitar o preço mais em conta para comprar aqueles galões de água mineral, vai devagar senão eles rolam e amassam toda a compra.

7) Chegou em casa, estaciona o carro, abre o porta-malas e deita a tirar as compras. Mora em casa? Então vai levar de saquinho em saquinho até a cozinha. Se mora em apartamento, vai atrás do carrinho. E não se esquecer que a etapa é outra, mas vale a mesma recomendação do “level five”. Ou faz tudo destrambelhado, quebrando e amassando uma porção de coisas, ou faz lenta e organizadamente, mas com o saco na lua!

8) Fé no Senhor! Está no final. Mas é claro que a última etapa tinha de ser das mais chatas. Agora é guardar as compras. E não pense que só porque a geladeira e as despensas estavam vazias significa que elas estavam limpas e organizadas. Vazia é maneira de dizer. Elas estão cheias de resto de comida, embalagens no final, produtos vencidos. Enfim, ir jogando a compra de qualquer forma pode estragar os alimentos novos ou, tão ruim quanto, simplesmente não vai caber. Então, mãos à obra e vamos limpando e organizando tudo antes de guardar. Uma dica: tire tudo das sacolas antes de abrir a geladeira e a despensa e começar a guardar. Assim você ganha tempo e evita o abre-fecha de portas. Dica 2, a indispensável. Antes de começar a guardar, pegue umas duas ou três cervejas e coloque no congelador. Elas estarão no ponto assim que você terminar o trabalho e serão uma merecida recompensa para o guerreiro. Ligue a TV, sente-se no sofá e brinde. Cheers!

Na verdade, para comprimir a história em oito etapas, resolvi deixar de fora algumas passagens, na verdade várias, geralmente mais curtas, mas nem sempre; e não necessariamente menos chatas. Vamos a estas, digamos, chatices menores com as quais somos brindados nas compras de mês:

a) O carrinho. Em algumas compras, esta é uma espécie de “vestibular” da fase 3, a da compra propriamente dita. Sobretudo em época de pagamento nas firmas, o movimento dobra e você tem de ficar esperando vagar um. E alguns supermercados ridículos deixam os carrinhos depositados em área distante do caixa, o que é muito desagradável quando é sua primeira compra lá e você só é informado quando já estava entrando na loja...

b) Farra do crédito. Crise? Não falem de subprime para o batalhão de moças na entrada. Se você for mil vezes àquele supermercado, elas vão te perguntar mil vezes se você já fez o cartão da rede, e você terá de responder educadamente mil vezes “não”. “Não fiz e não quero fazer, pô!”

c) Tirar as compras do carrinho e por na esteira do caixa. Simples? Jamais. E aqui você pode ser aporrinhado dos dois lados. Por mais que você espere a compra do cara que te antecedeu correr na esteira antes de começar a colocar a sua, ele vai te olhar com cara de poucos amigos, como se fosse você a pessoa mais inconveniente do planeta. Agora tem o contrário. Você nem bem terminou de colocar seus produtos na esteira e o cliente seguinte, com todo aquele ar de apressado e despachado, já está começando a colocar a compra dele. E nem tem o cuidado de evitar de por uma lata lambuzada de baygon bem ao lado da sua alface orgânica!

d) A fila do caixa pode reservar mil surpresas. Tem aquela também da fila curtinha, na verdade com apenas um único cliente, que está começando a por os produtos sobre a esteira. Você entra, se distrai, e nada de o sujeito terminar. Então você olha direito e descobre que se trata de um cara extremamente organizado. Ele colocou os produtos com tanto cuidado e esmero dentro do carrinho e, na verdade, a quantidade de produtos que ele está comprando equivale a umas três compras. Lata de leite condensado? Tem quinze, uma do ladinho da outra. E tome latinhas, de atum, pêssego em calda, e vidros de maionese, azeitona. Só agora você acordou para o fato de que o roliço consumidor à sua frente colocou o supermercado inteiro dentro do carrinho. E você esperando.

e) Tem também o pessoal sem pressa alguma. Normalmente em família. Para eles a compra é um passeio, um evento. Eles conversam entre si, com o caixa... E curtem cada etapa da compra. Colocam com todo o cuidado os produtos na esteira. Só depois começam a empacotar, amarrando as alças de saquinho por saquinho. E só depois começam a por de volta dentro do carrinho, normalmente “carrinhos”. Só após esta tarefa, o macho alfa da família, todo pimpão, tira a carteira do bolso para pagar. Antes, claro, ele dá uma checada no boleto do caixa, discute com a mulher se eram mesmo duas caixas de sabão em pó, se a maçã era gala ou fuji... "Benhê, você não ia pegar fraldinha pro churrasco?" O resto da fila, todos os demais clientes da loja, toda a humanidade, nada importa para tal cliente, apenas aquele precioso momento vivido no supermercado. E você aguardando.

f) Uma chatice séria é o boleto da compra. Já notou que nenhum supermercado erra o valor para baixo, só para cima? Aqui não adianta improvisar. A rede pode ter origem francesa, americana ou brasileira, tanto faz. Parece que o software das caixas-registradoras é o mesmo. Eles vão cobrar sempre a manga mais cara, embora você tenha escolhido a mais barata. E se você quis aproveitar aquele azeite com preço promocional e pegou cinco vidros, não se esqueça de checar. Muito provavelmente, o caixa passará o preço normal, bem mais alto. E tem também a pegadinha do produto em lugar errado. Você ficou feliz em achar um vinho francês com rotulo promissor por R$ 29,90, mas no caixa descobre que passou o preço de R$ 69,90, porque na verdade tinham colocado o francês em cima da etiqueta de um argentino...

Nunca passou por qualquer destas experiências? Você nunca fez compra de mês. É feliz e não sabia!