domingo, 7 de março de 2010

O inimigo das cotas ataca

O senador Demóstenes Torres (DEM) defende a velha tese de que no Brasil nao tem racismo. Tem sim, e do pior tipo, do camuflado. Qualquer negro, nordestino ou índio já viveu uma ou várias situações de discriminação. Os judeus também, mas, por serem geralmente ricos ou classe média, nao sentem o preconceito no nível econômico - onde ele é mais cruel e geralmente invisível, aparecendo apenas nos indicadores. Ao contrário do que diz o senador, os indicadores comprovam: há pobres brancos e negros, mas os negros sao bem mais pobres. Há ricos brancos e negros, mas os brancos sao infinitamente mais ricos. É difícil encontrar um branco pobre que venha de uma familia onde todos sao muito pobres. Sempre tem um arrimo. Entre os negros, isto é muito comum. Um negro pobre muitas vezes nao tem sequer um unico parente remediado a quem recorrer. Nao dá para comparar. E esta idéia de que as cotas vao transformar o Brasil em um país racista, opondo brancos a negros, é piada. As cotas estao aí e nada disso ocorreu. Mas o contrário é verdade. O Brasil nunca teve cotas antes, e a discriminação e o preconceito sempre existiram.

Uma comparação do Brasil com os EUA (onde existe cota há muito tempo...) é vergonhosa para nós. Lá, os negros sao apenas 10% (incluidos os mestiços como Obama) da população, e no entanto, mesmo sofrendo preconceitos, já elegeram um presidente. Há negros no Congresso, nos governos e nas diretorias das grandes empresas. No Brasil, onde negros e mulatos sao quase 50%, só recentemente um deles chegou ao STF... No entanto, enquanto nos EUA o racismo é admitido e enfrentado, no Brasil é proibido sequer falar nele. O que existe no Brasil não é a ditadura do politicamente correto, senador, e sim a patrulha da falsa democracia racial.

Ia esquecendo, ditadura do politicamente correto existe, sim, nos EUA. Lá, em qualquer filme, sempre tem que ter um personagem negro, e em posição de destaque. Aqui, só recentemente os negros na Globo deixaram de fazer apenas papel de empregada doméstica e ajudante. Aqui, já tivemos os casos das "paquitas", onde só podia entrar loira. Nos EUA, este tipo de coisa horrenda nunca poderia existir. Lá, os negros tambem sofrem, mas lutam por cada centimetro dos seus direitos, sem se deixar levar pelo argumento de "democracia racial". Aqui, os negros, antes tarde do que nunca, acordaram para nao serem enganados.

Mais uma coisa. O senador hoje acha um absurdo que os negros não celebrem a princesa Isabel. Quer dizer que, retroativamente, o senador é a favor da libertação dos escravos. Ok. Mas seria curioso se voltássemos no túnel do tempo para ver de que lado estaria o nosso ilustre representante do DEM. Ele estaria do lado dos progressistas que lutavam contra a escravidão ou estaria do lado da elite que não apenas era a favor do sistema, como tinha seus próprios escravos? Como seria? Não tem como matar essa curiosidade, pois o passado não tem volta. Mas é possível saber de que lado está hoje o senador: ele está contra um mecanismo que, mesmo tendo seus defeitos, tem o mérito de pretender dar um mínimo de direitos aos negros.

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